Artigo publicado no Portal da Cidade de Registro

Advogando há aproximadamente 15 anos, por muitas vezes notei que os conflitos judiciais deixavam de ser solucionados em razão da forma com que as partes e/ou os operadores do direito se comunicavam entre si e não pela questão jurídica propriamente dita.  

Isso porque a postura adversarial adotada pelos envolvidos não colabora para a conciliação, ao contrário, alimenta mais o conflito, reforçando mágoas e o sentimento de injustiça das partes ou rompe com a urbanidade tão necessária entre os operadores do direito.

Estudando um pouco sobre comunicação como ferramenta de aperfeiçoamento, cheguei ao esclarecedor conceito de comunicação não-violenta.

Antes, rapidamente, podemos dizer que a comunicação se apresenta em três instâncias: a verbal (escrita ou falada); a não verbal (que não necessita ser dita ou escrita, revelando-se pela postura corporal e expressão facial); e a mediada (realizada por meio de um recurso que liga as partes). Para que haja comunicação é preciso: um emissor (quem envia a mensagem); uma mensagem (informação); e um receptor (quem recebe a mensagem).

A boa comunicação deve ser efetiva e não violenta. Isso exige que o emissor transmita sua mensagem ao receptor de forma clara e que o receptor busque entender a mensagem para só então responder. Esse processo deve ser livre de julgamentos, distorções e ataques ao outro, focando no que realmente está sendo transmitido em termos de mensagem.

Podemos dizer que a comunicação não-violenta é uma forma de se comunicar que respeita a si mesmo e ao outro. Vai muito além de somente falar o que pensa de forma irrefletida e impor ao outro a sua necessidade pessoal ou de informação, pois ao enviar uma mensagem é preciso se colocar no lugar daquele que irá recebê-la e tratar o seu semelhante como você gostaria de ser tratado.

A prática da comunicação não-violenta pelos Conciliadores, Mediadores e Magistrados tem trazidos resultados muito positivos junto aos CEJUSC’S e Varas Judiciais do Brasil, e juntamente com essa visão de comunicação efetiva outras técnicas têm sido aplicadas. Entre elas destacamos a Constelação Familiar e a Justiça Restaurativa, pois ampliam a visão do conflito e descortinam o que precede ou é concomitante a ele, ou seja, o seu real motivo, olhando para todo o sistema relacional e não apenas para a técnica processual cabível ao caso concreto.

Dada essa evolução na forma de olhar o conflito, surgiu o termo Direito Sistêmico. Este termo foi cunhado por Sami Storch, Juiz de Direito que trabalha na Comarca de Itabuna, Bahia, e há mais de 10 anos pratica as técnicas de constelação familiar nos processos em que atua, sendo um dos precursores de sua aplicação no Judiciário brasileiro. O Direito Sistêmico inaugura a análise do conflito sob uma ótica baseada nas ordens superiores que regem as relações humanas, segundo a ciência das constelações familiares sistêmicas desenvolvida pelo terapeuta e filósofo alemão Bert Hellinger.

É importante lembrarmos onde aprendemos a nos comunicar: em nossos lares. Elisama Santos, em seu livro “Educação não-violenta: como estimular autoestima, autonomia, autodisciplina e resiliência em você e nas crianças” é categórica ao dizer: “É na infância que os filhos aprendem quem são e começam a traçar a personalidade dos adultos que serão.”

 A princípio, a criança se comunica com poucos recursos, mas o faz de maneira limpa e instintiva, demonstrando o que sente e enxerga no meio familiar; o adolescente, já com mais clareza, passa a refletir sobre o que comunica e traz consigo as referências dos seus pais; o adulto, mesmo de forma madura e bastante polida, informa o que pretende e reage ao que ouve, podendo elaborar melhor as suas posturas, mas continua espelhando a forma como foi educado. Logo, o primeiro modelo de comunicação é o que aprendemos na nossa família.

Outro ambiente em que a forma de comunicação irá influenciar definitivamente as nossas vidas é o da Escola. Atualmente a disciplina positiva é assunto em voga quando se fala em educação ante a relevância de sua aplicação pelas famílias e escolas, sendo entendida como um modelo educativo composto por firmeza, afeto e empatia.

Sendo certo que a infância é a fase crucial para a ampla formação do ser humano e que bons resultados na educação estão diretamente ligados à forma como nos comunicamos com as crianças/educandos, o que se deve fazer estabelecendo diálogos e cooperação visando buscar entender e respeitar as suas necessidades para lhe dar ferramentas de expansão física, emocional e cognitiva e firmar os necessários limites para o seu desenvolvimento adequado, é de suma importância a mudança de paradigma nos meios de formação do ser humano.

Se começarmos a ouvir e entender o outro para então respondê-lo como quem entendeu ou quer entender aquilo que está sendo dito, sem julgamentos e distorções, nosso comportamento se moldará de forma positiva em cada um dos espaços que ocupamos, seja no contexto familiar, do trabalho ou socialmente.

Dessa forma perpetuaremos o respeito, o que sem dúvida refletirá na construção de uma sociedade melhor e transformará a dinâmica do conflito.

Laura Moreira Pinto Santos, mãe do Enrico de 2 anos e 4 meses, Advogada, Pós-graduada em Direito Civil e Empresarial, Direito Processual Civil e Direito Público. É parceira do projeto Abra a Caixa. Atualmente cursando extensão em “Direito Sistêmico e as Constelações Familiares na resolução de conflitos” na Hellinger Schulle em parceria com a Faculdade Innovare, São Paulo.

E-mail para contato: laura.m@adv.oabsp.org.br.

Open chat
Estamos Online :)
Olá, tudo bem?
Estamos online no Whatsapp :)